Tuesday, March 17, 2009

Magia?

No Workshop dado pela professora Graça Capinha na última sexta-feira, do qual resultaram os dois poemas que publiquei no último post, comparou-se a poesia à magia.
Fiquei curioso com a quantidade de parecenças entre uma coisa e outra. No final de contas, a magia parece quase uma metáfora de poesia.

Por um lado, na poesia (ou em alguma), temos o objectivo de quebrar as leis da linguagem, de mudar o mundo. Mudá-lo através de palavras, versos, estrofes, em que o poeta expõe os seus sentimentos, as suas ideias. Henry David Thoreau fê-lo, assim como Whitman e muitos outros.

Mas então, o que é a magia (falo do conceito "popular") senão um conjunto de cânticos ou invocações em forma de verso, muitas vezes com rima? Magia, feitiços para ajustar a realidade à nossa vontade, tal como fazemos com a poesia.

E, com portões escancarados, o meu pensamento fluiu. Fluiu como uma torrente, em direcção à Inquisição, um dos períodos mais negros da história Europeia.
Durante a Inquisição assistimos a uma luta impiedosa contra a magia, em que milhares de pessoas são condenadas à Morte, por toda a Europa. Teoricamente, a Inquisição procurava julgar os praticantes de magia, as bruxas e os feiticeiros que falavam com o Diabo. Mas, como todos nós sabemos, por detrás de toda essa teoria encontravam-se interesses políticos e pessoais, e até ódio guardado entre vizinhos.
Tudo isso e não só. A Inquisição tinha também uma manifesta posição contra o progresso. Quem não sabe de tudo aquilo por que Galileu passou apenas por dizer que era a Terra que se movia à volta do Sol?

Mas em relação à magia "reprimida" pela Inquisição. Afinal, será mesmo a prática de magia aquilo que eles condenavam? E porquê a fixação na figura feminina, porquê a fixação na bruxa?
Talvez o termo magia tenha sido utilizado como um substituto de poesia. Quiçá as bruxas não tenham sido meras mulheres que lutavam pela sua condição social, que declamavam poemas a favor da emancipação do fantástico ser feminino. Ou de outras quaisquer mudanças sociais.


Talvez esteja a dizer uma grande barbaridade, mas o que é facto é que temos um (vários, melhor dizendo) exemplo de algo parecido - Zeca Afonso, durante o Estado Novo. Escrevia poesia, talvez como faziam muitas mulheres (e homens) durante o período da Inquisição, e usava-a como arma. E sofreu, assim como muitos homens e mulheres sofreram na Idade Média, às mãos da Igreja.


Agora pergunto-me se isto soa assim tão idiota. Mas pronto, aqui fica. Idiota ou não, uma divagação. Convém não ficar emerso na inactividade cerebral em que nos querem manter xD

6 comments:

Kath said...

Essa da Idade Média é um bocadinho exagerada. Normalmente os que iam para a fogueira (e muitos eram interrogados várias vezes, com a possibilidade de se arrependerem) eram os que cometiam heresias. Heresia não é o mesmo que paganismo, portanto acho que não tem a ver com a magia. Mas foi uma boa reflexão. ^^

Anonymous said...

Gostei da reflexão, Eragon.
Se bem que o "engrandecer do eu" seja questionável. Não acho que a criação poética - a poesia que encontra caminho pela mão do poeta - pretenda engrandecer o eu.
O poeta é o sujeito que olha, que regista, mas não se pretenderá que a poesia viva por si mesma, liberta do poeta que a fez palavra?
A poesia é de todos, também do poeta mas principalmente daqueles que a lêem.

Não sei se este é o local próprio para fazer um comentário a um comentário, mas...

(Kath)"acho que não tem a ver com a magia"
??????????
Não tem a ver com magia?...
Todos os defensores/praticantes de qualquer religião que não o cristianismo da Igreja Católica Apostólica Romana eram acha certa para a fogueira...
Tem tudo a ver com magia - com a magia ancestral, os cultos da terra e da lua, a fé e a re-ligação com o divino, nas suas mais diversas manifestações.
Sim, eram interrogados várias vezes, no meio das mais atrozes torturas, às quais ainda assim muitos resistiram - com uma vontade férrea, e uma fé sem limites naquilo que defendiam e de acordo com o que viviam - sabendo de antemão que isso significaria, de qualquer forma, a morte.
Quanto à "possibilidade de se arrependerem", isso não passa de um artifício...
Arrependerem-se de quê? De acreditarem em outra coisa? De defenderem as suas opiniões e escolhas de vida?

Francisco Norega said...

Obrigado às duas ^^

Catarina, acho que essa palavra, "heresias", é muito abrangente.
Heresias acabam por ser ideias divergentes, sejam elas de foro religioso, político, científico ou social/ideológico.
Não digo que muitos tenham sido condenados por professar outros cultos, mas penso que não será de todo descabido que a Igreja possa ter "mascarado" pessoas com ideias progressistas de bruxas ou feiticeiros com ligações ao Diabo.
E quem sabe se muitos desses progressistas não eram poetas? Fica a dúvida, ainda que nenhum de nós possa ir lá para confirmar ou contrariá-lo.
Afinal, muitos dos progressistas da actualidade foram/são poetas.

Mãe,
Quanto ao "engrandecer o eu", suponho que dependa um pouco da ideologia de cada um (poeta). Temos muitos que escrevem para o outro, mas também suponho que os haja com o objectivo de se engrandecerem a si mesmos.
Digo eu. xD

Kath said...

Não disse que concordava com a fogueira. :p O arrepender deveria ter estado entre aspas. O que digo é que existia "soft core heresy" e "hard core heresy". O que a igreja tinha como prioridade era matar os hereges, não os pagãos. Mesmo assim o que era mais importante eram as heresias que podiam afectar comunidades por se espalharem mais facilmente, como aconteceu com os Cátaros. A Inquisição, se não me engano, já não pertence à Idade Média, mas não tenho a certeza.

Kiko, heresias era aquilo que tinha como raiz a doutrina cristã mas interpretada de outra forma. O paganismo é que era as ligações a outros deuses. Hereges eram os que divergiam dos ensinamentos cristãos conhecendo-os.

Leto of the Crows - Carina Portugal said...

Penso que a ideia de inquisição varia de país para país e de anos para anos. Havia locais em que a "coisa" era bárbara, em que levavam muito a peito a ideia do paganismo, demónios, vampiros e blablabla. Enquanto que noutros era aplicada como repressão a ideias pouco favoráveis ao clero.

O caso do Galileu não é nada... há o caso de um homem chamado Giordano Bruno que aquilo até faz rir... o homem chegou a ser ex-comungado pelas 3 igrejas (e acabou por ir para a fogueira).

Quanto às comparações entre a magia e a poesia... realmente Kiko! Ainda não te tinhas apercebido disso? Coisa mais óbvia =P

Francisco Norega said...

"Quanto às comparações entre a magia e a poesia... realmente Kiko! Ainda não te tinhas apercebido disso? Coisa mais óbvia =P"
Que bom para o meu ego :D
xD

Obrigado pelo comentário :P